Falta de moradia foi o motivo da invasão do terreno no Icaraí que foi desocupado no domingo (6)

Desde o último final de semana do mês de abril que famílias vinham ocupando um terreno particular de aproximadamente 16

Por jangada.online em

7 de maio de 2018 às 00:19 atualizado às 00:21
Famílias ficaram aflitas com o despejo enquanto a cerca provisória era construída. FOTO: Tiago/jangada.online

Desde o último final de semana do mês de abril que famílias vinham ocupando um terreno particular de aproximadamente 16 mil metros quadrados que fica localizado ao lado da mansão Bonamezza, as margens da CE 090, no bairro do Icaraí, em Caucaia (CE). Pessoas sem moradia de vários bairros de Caucaia e de Fortaleza já tinham instalado barracas e partilhado os pedaços de terra em várias partes.

As famílias procuravam uma área para poder construir seus lares. A ideia inicial era ocupar a antiga e tradicional mansão Bonamezza que fica ao lado do terreno. Mas, quando tiveram acesso a casa pelo muro dos fundos que estava derrubado, depararam-se com um caseiro que pediu para não invadirem a área da casa. O caseiro então sugeriu a ocupação do terreno vizinho.

No último sábado a ocupação tinha completado oito dias quando na manhã deste domingo (06/5) os donos do terreno (um grupo empresarial de Fortaleza) executou a ação de reintegração de posse. Os ocupantes foram retirados da área e um grupo de trabalhadores de uma construtora iniciou a instalação emergencial de uma cerca de arame farpado e colocação de um contêiner dentro da área.

O jangada.online teve acesso ao representante da construtora responsável pela instalação da cerca o qual afirmou que em até 10 dias será erguido um muro cercando todo o terreno. Já a representação do dono do terreno disse que desde a última quinta-feira (03/5) vinha negociando a saída com os ocupantes, mostrando a documentação que constatava que o terreno pertencia a um grupo de empresários.

 

A reintegração    

Segundo os ocupantes, às 3 horas da madrugada deste domingo (06/5) o movimento em volta da área ocupada ficou acentuado e tenso com veículos e muito homens chegando e se aglomerando. Testemunhas falaram que o processo de reintegração teve algumas cenas de violência e arrogância por parte dos “desocupantes”.

“Entraram pela madrugada batendo e chutando as pessoas dormindo, incluindo crianças e mulheres. Correram atrás das pessoas colocando para fora do terreno e não deixaram tirar os nossos pertences. Puxaram até armas e deram tiros para assustar. Pessoas correndo dentro do mato, caíram e se machucaram. Tomaram também nossos celulares”, relata um dos ocupantes que pediram para não ser identificado.

 

Déficit habitacional

A moradia é um direito social previsto no artigo 6° da Constituição Federal. No Brasil o déficit de moradia chega a incríveis 7,7 milhões, segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV). No Ceará são 550 mil moradias. Em Fortaleza 41% da população vivem em moradia precária que aponta um déficit habitacional estimado em 80 mil moradias.

Com a política habitacional do Governo Federal paralisada há dois anos o déficit de moradia em Caucaia vem se agravando. 40% das 5.759 unidades entregues no município através do programa Minha Casa Minha Vida do Governo Federal, na época da presidente Dilma, foram destinadas as famílias cadastradas em Fortaleza. Caucaia reuniu boa parte dos investimentos do Governo Federal em razão da conurbação com Fortaleza.

Caucaia concentra cerca de 10% do déficit da Região Metropolitana de Fortaleza. Hoje o município tem um déficit de aproximadamente 15 mil unidades habitacional.

 

Legitimidade do movimento

Devido à carência e a necessidade da moradia, um direito constitucional, onde mais de 7 milhões de pessoas não possuem no Brasil movimentos sociais surgiram para dar suporte, medir forças e viabilizar um processo de conquista para este grande número de brasileiros que ainda não possuem residências.

Muitas pessoas sem moradia ou que residem com alugueis, de favor ou em áreas de risco se engajam em movimentos sociais para terem o seu direito válido. Por falta de políticas públicas que ajudem estas pessoas nos últimos dois anos o problema tem se agravado, inclusive em Caucaia. Como exemplo mais recente este movimento que ocupou o terreno privado no Icaraí.

O Movimento tenta dar dignidade para as famílias que ocuparam a área. Muita gente no município não mora numa área digna ou não tem moradia. Os movimentos sociais direcionados para causa habitacional cobram políticas públicas mais intensivas voltadas para moradia em Caucaia.

 

O que pensam os ocupantes

No terreno ocupado no Icaraí tinha muitas famílias que eram moradoras de rua e realmente sem teto. “No movimento deste porte sempre aparece gente se aproveitando da situação. Pessoas que tem posses, como veículo, infiltram-se, mas o movimento tem sua legitimidade”, explica um dos ocupantes. “Tem família que realmente não tem onde morar”, dizia outra ocupante que pediu para não ser identificada.

Os integrantes da ocupação alegam que o terreno estava numa situação sem dono diante dívidas, inclusive com IPTU. O movimento já se prontificava deixar a área caso a pessoa que se identificou como dona do terreno provasse a posse da terra.

“A moradia é um direito legitimo. Os veículos parados ao lado do terreno que muitas pessoas falaram nas redes sociais eram das pessoas ligadas as ONGs que estavam ajudando as famílias da ocupação com doação de alimentos, água e afins. Estamos aqui porque nós precisamos”, destaca outro ocupante que também pediu sigilo de sua identidade.

Gleiciane, moradora do Nova Metrópole há 30 anos, estava acampada porque não tem moradia. “Tenho dois filhos e preciso de moradia para viver. Neste terreno estávamos ocupando desde o último sábado. As crianças estavam lá por não temos onde morar. As crianças tem que acompanhar as mães. A maioria eram mulheres. A prefeitura não veio dar assistência a nós, disse emocionada.

Vindo do Conjunto Metropolitano, Luiz de Araújo, mora de aluguel.  “Estamos procurando uma terra para morar. Ocupamos inicialmente a mansão da Bonamezza, mas o caseiro não deixou a ocupação permanecer por lá. A área do terreno ao lado da casa foi segunda opção”, destaca.

“Estamos sem nada. Estamos atrás dos nossos direitos. Ninguém estava atrás de vender os terrenos não. Queríamos morar. Estamos atrás de ter uma casa digna num lugar feliz para viver”, desabafa um dos ocupantes que se feriu durante a ação de despejo.

 

O empreendimento

O jangada.online apurou que há interesse de construírem no local do terreno, que foi ocupado, um complexo de supermercado junto de um conjunto de pontos de lojas (shopping). Não tinha sido construído ainda devido os donos do terreno aguardarem a retomada da economia no Brasil.

A cerca foi levantada em tempo recorde neste domingo (06/5). FOTO: Tiago/jangada.online

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