Os sonhos musicados de um Mestre de Obras

Em novembro de 2013 o mundo do forró perdia um dos seus mais saudosos reinventores do estilo: Chico Bill. Na época o ainda blogueiro Tiago Viana escreveu uma crônica sobre a história do mestre das bandas de forró de Caucaia. Leia abaixo a crônica que estava perdida e foi recuperada em arquivos digitais do agora jornalista Tiago Viana.

Por jangada.online em

23 de abril de 2020 às 14:24 atualizado às 14:27
FOTO: reprodução/Internet

Tijolo em tijolo. Cimento e muita pedra para levantar o alicerce. Mãos calejadas de tanto erguer casas, muros. Pás, enxadas e colher de pedreiro. Mas, entre um tijolo, uma massa, um muro e uma casa, a música chamava atenção. O forró confortava o coração e lhe fazia esquecer os tijolos, o cimento, as pedras, as obras.

A sanfona de Luís Gonzaga e do então Mastruz com Leite fazia esquecer o riscado da enxada ao produzir a massa. E foi do sonho da música que fazia as pessoas dançarem que o Senhor Chico abriu as portas de sua própria casa para seus amigos e toda Caucaia festejar o forró bem dançado.

Debaixo dos coqueiros, seu quintal virou casa de shows. Forró quente, arrochado, bem escondidinho, e lotava. O bom forrozeiro abria seu quintal sempre aos sábados, no festejo quinzenal.

Bandas de sucesso começaram a abrilhantar seus shows. Criando seus cinco filhos e fazendo mil festas. Amado pela esposa, querido pelos filhos. Tantos foram os ensinamentos. Com dificuldade foi crescendo. Sempre levando no peito o amor pelo forró e a gratidão por Caucaia, onde sua música tocasse. Como Senhor Gomes do Tabapuá, dono da Gaivota, ou a Senhora Zeza, dona da Painel, pensava em levar o nome de Caucaia para muito longe.

E há vinte anos iniciava a sua própria banda de forró. A tocar as alegrias e angústias dos seus ouvintes. Veio à primeira sanfona, a primeira bateria, os primeiros sucessos. Sua filha era a vocalista. Na Barraca do João, no Icaraí, foi nestas ondas que sua música começou a ecoar pelo mar do sucesso sem fim.
As cartas de baralho estavam lançadas ao futuro. De jogo persistente e muita luta.

Das lágrimas da velha Belina veio a alegria de sempre após os shows todos os gastos serem pagos. Que diga o primeiro ônibus verde que levava o Real para mais uma festa. De pneu furado na ida, que o borracheiro confiou, e no final do show, de volta para casa, o pneu consertado foi devidamente pago.

E vinham depois a Quadra do Antônio dos Santos e o quintal que agora se chamava de Quadra do Chico Bill. Das quartas-feiras no Forró do Turista, da Barraca do João, que fez da sanfona do Forró Real tocar em rádio, se apresentar na televisão. Ficar famoso entre as melhores bandas de forró do Brasil.
Sem conhecimento das letras, os tons dos acordes era corrigido na hora. Ensinava aos músicos da banda, sem nem ao menos tirar a carteira de músico. Pelas lagoas os peixes também sentem a falta de suas iscas. Mas, das lagoas e dos rios os mesmo peixes agora aplaudem os inúmeros animais fisgados que um dia fizeram a felicidade do Pai Real.

Mestre de obras que sonhou, lutou e virou empresário de banda de forró. Respeitado entre os demais. Marcou e fez história na música com seu estilo próprio de gerir as bandas. Menino pobre que trabalhou desde cedo. Levantava casa e sonhava com a música. Venceu e deixou seu jeito próprio como estilo de vida. Orgulho da gente que levou sua música e Caucaia para o mundo.

E se tiver alguma coisa errada, derruba a parede e faz tudo de novo.

 

Tiago Viana

Twitter: @tiagoviana

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